quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

PENSANDO A ARTETERAPIA


Por Eliana Moraes

“Há muros que só a paciência derruba.
Há pontes que só o carinho constrói.” Cora Coralina


            Estes versos de Cora Coralina chegaram até mim em um cartão de natal que recebi de uma paciente. E automaticamente me lembrei das discussões que o grupo de estudos que coordeno “A prática da arteterapia” construiu durante o ano de 2014.
            Ao refletirmos sobre as especificidades da técnica da arteterapia e a atuação do arteterapeuta diante do paciente, observamos que não raras vezes o arteterapeuta prioriza as técnicas que proporá ao seu paciente/cliente e se dispersa do que é mais importante no setting terapêutico: o próprio paciente/cliente. Discutimos sobre o perigo tão sutil, mas na mesma proporção perigoso, que o arteterapeuta pode se perder: voltar o olhar para si – suas interpretações, seus desejos, sua ansiedade, suas necessidades –, por que não dizer, narcisicamente. Desta forma, dispersa-se do protagonismo do paciente em seu caminho de autoconhecimento. Jornada que pertence exclusivamente à ele, e ao arteterapeuta cabe estar junto.
            A cada encontro discutimos como é importante que o arteterapeuta esteja atento e se instrumente teoricamente sobre os fenômenos da relação paciente-terapeuta: a transferência e a contratransferência e seus manejos. Que mesmo a arteterapia tendo como especificidade utilizar das técnicas expressivas como base, a relação paciente/cliente e terapeuta se manifesta de forma imperativa. E se o arteterapeuta não estiver instrumentalizado para manejá-la em paralelo com as técnicas expressivas, não estará alcançando seu trabalho como terapeuta de forma plena.
            Ao percebermos esta lacuna em nossas formações, dedicamo-nos à leitura de textos que nos embasasse teoricamente sobre estes fenômenos e discutimos como estes conceitos se manifestaram na prática de cada arteterapeuta participante do grupo. Assim, a partir de uma grande discussão e troca o grupo chegou à algumas importantes conclusões e pontos de atenção para a prática da arteterapia: o protagonismo do paciente em seu caminho de autoconhecimento e o papel do arteterapeuta de estar ao lado; os fenômenos da relação paciente/cliente, a importância de seus manejos e a necessidade do arteterapeuta (ser humano que é) ter espaços para pensá-los – sua terapia pessoal, supervisão e grupo de estudos; tomamos como propósitos para 2015 estudarmos e discutirmos o triângulo paciente-terapeuta-técnica expressiva, e sobre como podemos contribuir para que nossa profissão se estabeleça cada vez mais na área da saúde, em equipes interdisciplinares e instituições.
            Estamos engajadas no propósito que o nome deste blog já traz: “Pensando a Arteterapia”. E estendemos nosso convite para aqueles que, apaixonados ou ainda curiosos, tenham o desejo de partilhar conosco esta jornada. Que venha 2015!

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

O DIÁLOGO ENTRE HISTÓRIA DA ARTE E ARTETERAPIA EM 2014


                                   Fotografia: Palestra vivencial "Dadá e Surrealismo na prática da Arteterapia" no Clube da Arte

Por Eliana Moraes e Flávia Hargreaves

            Dezembro, o último mês do ano, chegou, e com ele o convite de fazermos uma reflexão sobre o ano que passou. E o blog “Não Palavra” também se propôs a fazer um balanço sobre o que foi o ano de 2014 em nossa jornada de pensar - e contribuir para – a arteterapia.

            Primeiramente abordaremos a pesquisa  sobre a aplicabilidade da História da Arte na prática da arteterapia, que começou o ano como um embrião envolvido por um grande desejo e uma intuição.  Com o passar dos meses este projeto foi criando corpo e hoje é uma realidade com o curso “Arteterapia: História da Arte para quê?”

            Neste ano vivemos a alegria de promover com duas turmas o Múdulo I: Pré-História e Primitivismo e com uma turma o Módulo II: Antiguidade Clássica e Classicismo. Acreditamos que esta foi uma vivência bastante intensa para aqueles alunos que aceitaram o convite de fazer um profundo mergulho nestes períodos da história do homem e da arte, mas também bastante intenso para nós que os promovemos. E atualmente estamos gestando com todo carinho o Módulo III: Idade Média para início em 2015.

            Entretanto, nossa pesquisa sobre os Movimentos da Arte aplicados na Arteterapia, não poderia deixar de abrir um espaço de destaque para os movimentos Dadá e Surrealismo, pois foram nossos primeiros estímulos para abrir este diálogo entre História da Arte e Arteterapia.

Nos últimos meses nos dedicamos em especial à estes dois movimentos, por tratarem de modo muito particular a desconstrução, o caos e o acesso ao inconsciente, ao mundo da imaginação e dos sonhos.

Tivemos o privilégio de abrir e fechar as palestras do Clube da Arte de 2014 (promovido por Luciana Machado), com as palestras “Arteterapia: História da Arte para quê?” em (10/09/14), e “Dadaísmo e Surrealismo na prática da Arteterapia”, dia (26/11/14). Tivemos também a oportunidade de realizar palestras sobre o tema na Faculdade Estácio de Sá – curso de Psicologia – unidade Norte shopping (07/10/14), no Curso de Formação em Arteterapia Artemísia - Niterói (10/11/14) e no evento “Surrealismo” promovido pela AARJ (27/07/14)

            Estes dois movimentos permanecerão como objeto de nosso trabalho no próximo ano pois, prestes a completar 100 anos, o Dadá continua vivo, atual e mobilizando discussões nos espaços de Arte. No mês outubro, o Rio de Janeiro recebeu dois eventos sobre o tema: o curso com Marc Dachy - Retorno a Dadá (Museu de Arte do Rio – MAR, 15 e 16/10/14) e  Dada on Tour – Zurique 2016, uma vídeo instalação itinerante que antecipa o centenário do dadaísmo (Casa Daros, Rio de Janeiro, de 22 a 26/10/14). O Surrealismo não ficou atrás, o CCBB RJ nos trouxe a exposição de Salvador Dali (maio e junho) e a Caixa Cultural, a Magia de Miró (julho a setembro) com seus desenhos.

            Olhamos para 2014 como um ano de realizações pois passos importantes foram dados em nossa jornada. Entramos em 2015 bastante motivadas com nossa pesquisa sobre a riqueza que a História da Arte pode proporcionar para a prática da arteterapia. Nosso convite permanece aberto a todos àqueles que têm curiosidade ou que já conheceu um pouco do nosso trabalho, que no próximo ano compartilhe conosco desta tão apaixonante jornada.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

DO ABSOLUTO AO ABSTRATO, AS VERDADES DESCONSTRUÍDAS NO MUNDO DA ARTE


                           
Vassili Kandisnky (Russo. 1866-1944). Primeira Aquarela Abstrata (1910).


Por Maria Cristina Resende

A cena acontece no início do século XX, um momento político-sócio-cultural tenso. Nas ciências, mudanças para todos os lados, a física com a relatividade e a física quântica, no mundo psi a psicanálise e a sua interpretação dos sonhos, na política a guerra! E a Arte? Onde ela está nesse momento, ou melhor, como ela reflete esse contexto social?

Primeiramente podemos perceber que as palavras de ordem no início do século XX são: MUDANÇA e DESCONSTRUÇÃO. O homem se encontra diante da necessidade de revisão das verdades outrora tidas como absolutas. Formas antigas dão lugar a novas modalidades de pensar, de calcular, de sentir e também de expressar. E na busca por essa desconstrução do mundo das formas, o abstrato surge, na Arte, como uma possibilidade de entrar na subjetividade do mundo.

A física nos mostra que a matéria não é tão sólida quanto pensávamos, que ela é na verdade “cheia” de espaços vazios, que o tempo não é linear, é relativo. As ciências da mente nos mostram que existe “algo” que pensa em nós, e às vezes por nós, a Psicanálise recupera a importância dos sonhos sob uma nova perspectiva. O mundo não é mais regido pelas leis racionais de causa e efeito, não existem mais certezas e verdades, não há mais um “porto seguro”, não podemos mais confiar nos nossos sentidos, nos nossos olhos, pois existe um universo naquilo que não vemos, no imaterial, no abstrato. A subjetividade se revela e a Arte busca expressar este novo mundo com novos e múltiplos caminhos. A objetividade e a precisão dão lugar a uma nova percepção sobre as coisas do mundo, pois nada mais é somente aquilo que se vê, há uma “alma secreta” nas coisas, há algo que os olhos não percebem e que a Arte captura.

Este é o tema dos últimos encontros do “Grupo de Estudos em Arteterapia: O encontro da Arte e da Psicologia no setting arteterapêutico”, que coordeno ao lado de Flávia Hargreaves, na Casa 2,  onde buscamos compreender o papel da Arte, o como ela irá dar forma e expressar as tensões e as mudanças na sociedade, sejam elas de fundo político, cultural, econômico ou científico. Buscamos junto a esta reflexão, fazer uma analogia ao que ocorre na clínica com a arteterapia e o uso das técnicas expressivas em psicoterapia, onde a expressão plástica do cliente será também o desdobramento das tensões, angústias e transições vivenciadas por sua psique.

Através do atual estudo do texto “O simbolismo nas artes plásticas”, de Aniela Jaffé (O Homem e seus Símbolos), percebemos que os movimentos artísticos seguem lado a lado ao movimento individual de qualquer pessoa. Quando os nossos paradigmas vigentes estão em desconstrução, buscamos a percepção desse novo mundo e novas formas vão sendo descobertas. A arteterapia busca acessar essa “alma secreta” das coisas, aquilo que os materiais possuem e que à primeira vista não percebemos. Assim como em nossa psique, nossas atitudes muitas vezes contêm uma “alma secreta” que nossa mente consciente não percebe. Em nossa psique profunda habita também uma “alma secreta” que se constela através das práticas terapêuticas, e a arteterapia “toma emprestado” a riqueza do discurso dos movimentos artísticos para a captura dessas várias “almas secretas” escondidas dentro-fora de nós.

GRUPO DE ESTUDOS EM ARTETERAPIA

O encontro da Arte e da Psicologia no setting arteterapêutico

com Maria Cristina de Resende e Flávia Hargreaves

Encontros quinzenais. Segundas-feiras. Das 18:30h às 20h.

Local: Casa 2. Botafogo. Rio de Janeiro.

Contato: crisilha@hotmail.com

 

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

HISTÓRIA DA ARTE COMO ESTÍMULO PROJETIVO


Parte central do tríptico “Jardim das Delícias”, 1504, 
Hieronymus Bosch (1450/1516 | Países Baixos), Acervo: Museu do Prado, Madri.

Por Eliana Moraes e Flávia Hargreaves

Nossa jornada pela História da Arte iniciou-se por pura intuição em 2009, quando decidimos estudar a biografia de alguns artistas. Conhecê-los nos fez perceber como suas histórias de vida transbordavam para seus processos criativos e decidimos experimentá-los. Mais adiante, percebemos que não só os artistas individualmente, mas os movimentos artísticos ao longo de toda a história do homem são transbordamentos de um contexto histórico que traduzem questões humanas no coletivo.

Nossa pesquisa foi avançando e percebemos que ao longo da história da humanidade e sua intensa produção de imagens, o homem desenvolveu técnicas, foi movido por necessidades e desejos diversos, usou a Arte com intenções e funções distintas (políticas, religiosas, educativas, etc.), desenvolveu sua inteligência, habilidades manuais e imaginação. Em todos os tempos, a Arte se apresenta como uma necessidade na intermediação do homem com o meio, buscando um equilíbrio.

Como arteterapeutas, nosso encantamento pela História da Arte se aprofundou ao constatarmos que toda esta dinâmica nos oferece instrumentos poderosos e inspiradores para a nossa prática. Levar para o setting terapêutico (individual ou grupo) conteúdos da História da Arte como estímulo projetivo –  seja apresentando a biografia de um artista e/ou experimentando seu processo criativo no campo individual, ou entrar em contato com determinado movimento artístico, seu contexto histórico e motivações expressivas no campo coletivo – significa rever o potencial e a aplicabilidade desta como ferramenta na arteterapia.

Em nossa formação como arteterapeutas com base teórica na Psicologia Analítica de Jung, estamos familiarizados com o conceito de inconsciente coletivo, camada mais profunda da psique, onde residem os “arquétipos”, estruturas herdadas, constituídas ao longo de milhares de anos e que correspondem às experiências humanas compartilhadas como nascimento, morte, juventude, envelhecimento, pai, mãe, etc. Temos acesso a este vasto material, comum a todos os homens, através de imagens que surgem em sonhos e fantasias materializadas na produção artística.

Estamos habituados a utilizar como estímulo projetivo contos e mitos, partindo do princípio que simbolicamente os conteúdos destas histórias são figuras arquetípicas presentes em nosso psiquismo. Embasadas em nossa pesquisa e prática, acreditamos que a História da Arte também se apresenta com grande potencial de estímulo projetivo, com sua grande riqueza e diversidade de estilos, linguagens, técnicas, motivações, sempre dando forma às questões humanas individuais e coletivas. Esta proposta dá ao paciente/cliente a oportunidade de entrar em contato com estes diversos homens/épocas, identificando como estas imagens os afetam, observando o processo de como se percebe neste contexto, como se sente experimentando este estímulo e processo criativo. É confortável, desconfortável? É um desafio possível de seguir em frente ou é “agressivo” demais para mim? É estimulante ou motivo de resistência? E assim por diante...

O estímulo por mitos e contos muitas vezes demanda um exercício de interpretação simbólica que para alguns perfis de pacientes/clientes é mais difícil entrar em contato. A especificidade de utilizar a História da Arte, está em trazer fatos, histórias reais, localizadas no tempo e no espaço, imagens mais próximas e de fácil acesso, mas que, como os mitos, trazem conteúdos ricos e possíveis de amplificar, tendo sempre em mente que é justamente a Arte a principal responsável por materializar, dar forma, ao longo da história da humanidade aos conteúdos do inconsciente coletivo, ilustrando inclusive os contos e os mitos.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

"CARTAZ PARA O AMANHÃ"

 Por Eliana Moraes


            No dia primeiro de outubro é comemorado o dia internacional do idoso e em atenção à esta data propus aos meus pacientes de arteterapia da UIP/HAS* que fizéssemos a exposição “Cartaz para o amanhã”. Inspirados na exposição “Poster for Tomorrow” que esteve em cartaz até o dia 12 de outubro de 2014 na Caixa Cultural do Rio de Janeiro, os pacientes produziram cartazes representando alguma questão ética/política que os impactassem.

            A inspiração se deu na descrição da exposição:

“O cartaz é a primeira peça gráfica de comunicação urbana... No Brasil, há pouca tradição em cartazes... Pensando na vocação democrática dessa peça gráfica, a organização sem fins lucrativos Poster For Tomorow... partiu da ideia de mobilizar pessoas do mundo todo, para criar cartazes com o fim de discutir e transmitir mensagens relacionadas aos Direitos Humanos.” (Maiores informações: www.posterfortomorrow.org)

            Contrariando possíveis crenças do senso comum de que o idoso já deu sua contribuição à sociedade, que já disse o que poderia ter dito ou que já não pode mais contribuir para o amanhã do nosso planeta, os clientes da UIP exerceram através desta exposição sua micropolítica – aquela que executamos a cada ato em nosso cotidiano. Em mês de plena discussão e eleição em nosso país, demonstram que é possível exercer a cidadania e comprometimento com a sociedade para além do ato de votar. E isto se deu através da arte, a qual ao longo de sua história, por diversas vezes desempenhou a função de posicionamento político (como por exemplo os movimentos dadaísta e surrealista, tão explorados neste blog).

            Nesta exposição ficou o convite para sua apreciação, mas sobretudo o convite para que o expectador refletisse sobre suas possibilidades de contribuição para o nosso amanhã.

            Para nós arteterapeutas, destaco dois pontos que esta experiência me despertou. Primeiramente, o grande potencial da arteterapia de responder à sensação de invisibilidade social do “idoso” (do ser humano) pois suas ideias, pensamentos e sentimentos são expressados e se tornam materiais, portanto visíveis. Em segundo lugar, o grande potencial que a arteterapia tem para se estabelecer como saber e técnica dentro de uma equipe multidisciplinar e/ou instituição. Creio que este é um espaço ainda muito pouco alcançado por nós, pois aonde já atuamos em muitas vezes é feito por voluntariado ou estágio.

            Deixo aqui também o meu convite aos arteterapeutas que reflitam sobre suas possibilidades de contribuição para o amanhã de nossa tão linda profissão!
 
 

* Unidade Integrada de Prevenção do Hospital Adventista Silvestre
 


terça-feira, 16 de setembro de 2014

PALESTRA: HISTÓRIA DA ARTE PARA QUÊ? – Um relato




Por Eliana Moraes e Flávia Hargreaves

No último dia dez de setembro Flávia Hargreaves e eu apresentamos palestra no “Clube da Arte” no espaço de arteterapia de Luciana Machado. Lá pudemos compartilhar um pouco da pesquisa que nós estamos desenvolvendo sobre a aplicabilidade da História da Arte na prática da arteterapia, nos últimos anos.

Primeiramente pudemos perceber como conceitos, expressões e definições na literatura da arte referentes aos mais variados períodos da história são altamente aplicáveis nos propósitos da arteterapia. Observamos que a arte desempenhou várias funções ao longo da história neste papel de mediadora entre o homem e o mundo. E nossa pesquisa e prática nos diz que experimentar os diversos “homens”, seus movimentos artísticos e estilos, atualizando-os no setting arteterapêutico, se mostra um excelente instrumento ao arteterapeuta ao promover como estímulo projetivo, reflexões, insights, resignificações e autoconhecimento.  

Em nosso relato, demos ênfase à Pré-História e Antiguidade Clássica: períodos estes que mais nos aprofundamos em pesquisa e produção de material até o momento. Ao entrarmos em contato com as imagens que guardamos em nossa imaginação sobre o homem pré-histórico, por exemplo, resgatamos o momento em que o homem se percebe no mundo e dá seus primeiros passos em direção à transformação e ao domínio da natureza, à civilização, à cultura e à arte. Em seguida, abordamos algumas possibilidades de aplicação destes conteúdos na nossa prática e conversamos sobre perfis de clientes que entendemos ser interessante o uso tanto destas reflexões teóricas como o uso das técnicas e materiais do período em questão.

Por fim, apresentamos as propostas dos dois módulos do curso “Arteterapia: História da Arte para quê?” que estamos oferecendo atualmente. (Maiores informações pelo email elianapsiarte@gmail.com)

Agradecemos o convite da Luciana Machado por esta rica oportunidade de troca e aos colegas que tão gentilmente aceitaram o convite de conhecer esta jornada que tanto tem nos movido e encantado!
 
 
 
 

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

O ENCONTRO COM A DIVERSIDADE


O texto de hoje foi escrito por Maria Cristina Resende, fruto de sua pesquisa inspirada no trabalho desenvolvido juntamente com Flávia Hargreaves: Ateliê Livre, em arteterapia. Recomendo este trabalho e a leitura do texto. Bem vinda Cris!


O objetivo desse ateliê livre é a promoção do encontro com diversos materiais e suas diferentes possibilidades de manejo. Pensamos que o processo de confronto com essa diversidade possibilita que a dinâmica de projeção aconteça, uma vez que a energia psíquica encontra diversas possibilidades de se ligar. Isso acontece sem a interferência inicial da fala, apenas o encontro com a diversidade e a apenas mínima orientação de seguir o que o desejo impele o individuo a fazer. Nesse encontro, espera-se que aconteça de fato um encontro entre a energia psíquica e a linguagem que o material oferece para sua expressão. A partir dele o diálogo entre o desejo e o material expressivo pode se estabelecer, com a expectativa do mínimo de atravessamento egóico, racional, apenas o desejo de algum lugar longínquo que ainda pode encontrar ali uma brecha para “falar” de diversas formas.

Percebemos, no entanto, que nos primeiros contatos há uma enorme contaminação do ego na escolha dos materiais, a partir da escolha daquele mais conhecido ou o mais confortável. No meio do seu processo criativo, o desejo de fazer esse ou aquele movimento, acrescentar esse ou aquele material pode promover um fluxo energético que leve a um afrouxamento do ego e então o desejo começa a vir de outros lugares desconhecidos. Há que se observar se esse “plus” é oriundo de um desejo livre ou se ainda é interferência do ego que busca uma estética estável e sem o mínimo de brechas.

Sendo assim, essa escolha dentro de um ateliê de arteterapia nos mostra que o processo de resistência se instala quando o indivíduo recusa o uso de um material “estranho”, desconhecido ou incômodo. Nesse momento podemos fazer duas observações, sendo a primeira sobre certa retenção do fluxo criativo do individuo quando este se nega a experimentação de um novo material, partindo do pressuposto que o indivíduo buscou livremente um espaço de expressão através de diversos materiais diferentes entre si. Logo, a evitação de confrontar certo material em certo momento do seu processo terapêutico aponta para algum conteúdo evocado, possivelmente ainda inconsciente, que desperta o processo de resistência do Ego. Isso nos leva a segunda observação a respeito da velocidade que o encontro com diversos materiais nos revela as brechas para questões difíceis e temidas de serem abordadas pelo indivíduo. Todavia, isso não significa que o facilitador ou o terapeuta devam apontar para esse caminho de imediato só porque ele pode “trazer a sombra” - meta de muitos terapeutas sedentos em iluminar a todo custo toda e qualquer questão de seu cliente - é preciso observar as dinâmicas da relação transferencial e da estrutura egoica a se abrir para esse diálogo.

A hipótese que surge desses apontamentos é: o bloqueio do processo criativo dentro de um ateliê arteterapêutico revela um processo de resistência? Será possível através do uso terapêutico dos materiais expressivos ir, no ritmo do processo de individuação do cliente, aumentando cada vez mais esse encontro (de fato) do individuo com sua multiplicidade? Com sua diversidade psíquica?


segunda-feira, 18 de agosto de 2014

DALI E A JORNADA TERAPÊUTICA



Por Eliana Moraes

            Ontem visitei a exposição de Salvador Dali no CCBB Rio de Janeiro e hoje gostaria de dedicar o espaço de reflexão do blog a este artista tão rico! Destaque para o seu Manifesto logo na entrada, com o título: “Declaração da Independência da Imaginação e dos Direitos do Homem à sua Própria Loucura”.

            Porém, aproveitando o ensejo, hoje gostaria de compartilhar o “encontro” que vivi com uma das obras de Dali, pouco conhecida, pouco divulgada, que ilustra este texto, chamada “Batalha nas Nuvens". Este encontro se deu quando me dei conta que ali estava representado em imagem, aquilo que eu estava vivendo em minha análise pessoal. Uma grande potência de emoção me tomou, levei o livro com a imagem para o meu analista e bastante emocionada, só conseguia repetir: é isto que estou fazendo aqui.

            Acredito que posso afirmar - por teoria e por experiência pessoal e clínica - que as imagens produzidas por artistas ao longo da história são um excelente instrumento projetivo ao arteterapeuta. Ali estão expressados, materializados e “coisificados” conteúdos profundamente humanos. E ao observarmos e aprofundarmos o olhar para estas imagens, poderemos projetar conteúdos pessoais que ainda não tivemos condições de traduzir em palavras. Quando nos aprofundamos no estudo da potencialidade do conceito de  projeção, poderemos responder a pergunta “O que esta imagem significa?” com  “Está nos olhos de quem vê!”.

            Para mim, esta tela significou “o retrato da jornada terapêutica”. Há uma porta em que alguém entra, transforma-se em “menina” (pois dentro desta sala não existem nomes, títulos, referências, apenas um sujeito), se senta e como um filme começa a revisitar sua biografia, seus conflitos, suas dores, suas batalhas internas. Estas batalhas não são “concretas ou corporais”, não é feita de armas ou bombas. Mas existem e são feitas de nuvens porque são de outra ordem. E nuvens podem se dissipar com o sopro do vento.

            Estas batalhas precisam ser revistas e repensadas e este processo já significa outra batalha, porque revisitá-las dói. Precisa ser feito em um ambiente seguro, acolhedor, por isso do lado de dentro da porta. Mas esta porta também é de saída, pois  não é saudável que se entre neste lugar, tranque-se  a porta e ali permaneça-se contemplando as batalhas de forma inócua. Entrar nesta sala significa rever, repensar, ressignificar e se preparar para a vida que continua fora da sala.

            Do que meus olhos viram nesta imagem, ficam para mim duas coisas: da responsabilidade que tenho comigo de repensar “minhas batalhas em nuvens” e da responsabilidade que tenho com meus pacientes de proporcionar-lhes um lugar seguro para este repensar e que eu esteja ao lado para acompanha-los nesta jornada. 

quinta-feira, 31 de julho de 2014

Arteterapia: Antiguidade Clássica e Classicismo para quê?

O que os antigos egípcios, gregos e romanos tem a nos ensinar para lidarmos melhor com as nossas questões e dilemas contemporâneos?

 Por Eliana Moraes e Flávia Hargreaves

Trabalho realizado durante o curso inspirado na Grécia.

O Egito nos leva a uma reflexão sobre nossa biografia no embate com a morte e a promessa de eternidade. A Grécia nos desperta para o pensamento, para a beleza livre de excessos. Roma nos obriga a voltar o nosso olhar para a realidade concreta e objetiva. O olhar através da eternidade, das regras, da filosofia, da estética, da utilidade e da eficiência nos faz perceber o quanto necessitamos desenvolver cada um destes aspectos para trilhar nosso caminho com sucesso, mantendo equilibrados nossos desejos e nossas necessidades.

O curso sugere um passeio no tempo, em que vamos até os tempos do Antigo Egito, da Grécia e Roma Antiga, e de lá e trazemos o que nos interessa para os dias de hoje, para as nossas vidas, para o nosso papel como terapeutas. Percebemos, ao longo desta jornada, o quanto trazemos em nós destes homens que experimentaram, sentiram, pensaram e criaram nos tempos antigos as bases da nossa cultura, da nossa sociedade e do nosso imaginário.

Formato do curso

O curso é oferecido em módulos independentes, permitindo ao aluno cursar os temas que lhe interessam livremente.

A estrutura de cada aula é montada em três momentos bem definidos:

No primeiro há uma aula expositiva de história da arte, com apresentação de imagens e textos teóricos sobre o período estudado, sua contextualização histórica, a função da arte e as motivações e expressões possíveis para aquele “homem” com o qual entraremos em contato.

Num segundo momento há a vivência de uma ou mais técnicas de arteterapia inspiradas neste contexto, partindo do princípio de que é muito importante que o arteterapeuta experimente em si aquilo que irá propor ao seu cliente e também que explore os materiais para que tenha o manejo sobre ele.

No terceiro momento, trocamos de lugar para a perspectiva do profissional arteterapeuta. São discutidas questões sobre a aplicabilidade das técnicas vivenciadas, com que perfil de clientes, em que contexto, com que possíveis adaptações. Em alguns momentos, fazemos estas reflexões à luz de casos clínicos que enriquecem as discussões.

E por fim, refletimos também sobre questões que estes contextos históricos nos inspiram, para a formação do profissional de arteterapia que tem o desejo de se estabelecer como tal.

Recebemos como feedback que este curso tem trazido grandes frutos para quem o vivencia. E podemos dizer que também tem sido muito intenso, apaixonante e recompensador para nós compô-lo e dividi-lo com aqueles que embarcam nesta jornada.
_________________________________________________________________________________

 CURSO
Arteterapia: História da Arte para quê?
Professoras: Eliana Moraes e Flávia Hargreaves

PRÓXIMAS TURMAS:
Modulo 1: Pré-História e Primitivismo
Barra: Domingo. Mensal. Das 10h às 17:30h. 4 aulas.
Botafogo: Quinta. Semanal. Das 10h às 12h. 8 aulas

Módulo 2: Antiguidade Clássica e Classicismo
Botafogo: Terça. Semanal. Das 18h às 21h. 8 aulas.

Informe-se sobre as novas turmas através do email: elianapsiarte@gmail.com

terça-feira, 29 de julho de 2014

EVENTO AARJ SOBRE SURREALISMO - Um relato




“O surrealismo consiste no cultivo e na prática de comunicar o inconsciente utilizando-se da escrita, da pintura, da escultura e de outros meios.”
(Edward W. Titus. Editor da revista The Quarter. Inglaterra.1932).

            No último domingo Flávia Hargreaves e eu estivemos no evento da AARJ sobre  Surrealismo, inspirado na exposição de Salvador Dali no CCBB-RJ. Lá pudemos apresentar um pouco mais o resultado sobre nossa pesquisa sobre o Surrealismo e a Arteterapia.
            Flávia apresentou a palestra “Acaso e inconsciente: identificando o dada e surrealismo na arteterapia”, onde apresentou a importância dos movimentos artísticos Dadaísmo e Surrealismo para nossa prática, e a convergência dos pensamentos destes artistas e teóricos e os princípios básicos da Arteterapia, propondo uma reflexão sobre o processo criativo que tem por princípio estabelecer uma ponte com o inconsciente.
            Em seguida, apresentei a palestra “Dada e Surrealismo na prática da Arteterapia – casos clínicos” onde coloquei fragmentos de minha prática de aplicação das técnicas destes movimentos em dois grupos arteterapêuticos de 3ª idade e um atendimento individual. Pudemos perceber que estas técnicas são pertinentes a serem trabalhadas com pacientes de perfil racional e controlador. Com questões como pensamento enrijecido e cristalizado, necessidade de manter a ordem e a estabilidade. Que trazem marcas de um tradicionalismo, educação rígida, regras e uma visão polarizada (bem/mal; certo/errado).
            Nos casos de grupo, três das técnicas exploradas pelos artistas foram expostas. O poema dada (já mencionado e relatado neste blog) e duas formas de desenho automático: com nanquim e areia. No caso individual, além destas, técnicas de pintura espontânea e escrita automática. A prática destas técnicas no setting terapêutico possibilita o aparecimento do que chamamos de “símbolo espontâneo”, um símbolo que emerge do ato criativo sem que se passe pela escolha ou racionalização do paciente (“vou desenhar uma borboleta pois esta simboliza transformação.”). Mas um símbolo, que justamente por ter sido acessado de forma espontânea, conteúdos inconscientes transbordam para a imagem de forma muito potente e justamente por isto, muitas vezes objeto de resistência por parte do paciente.
            Concluímos então que as experimentações e técnicas feitas pelos dadaístas e surrealistas são amplamente aplicáveis no setting terapêutico propondo flexibilidade, maleabilidade, o não controle, o acaso, características tão pertinentes à vida. Encerramos com um poema dada produzido por uma paciente que compreendemos resumir a essência do que é a vivência surrealista: “Voo livre: o invisível revolucionando o papel da experiência...”

             Finalizando o evento, Claudia Brasil, apresentou a palestra O Surrealismo e o arquétipo do inválido na prática da arteterapia”, onde apresentou o surrealismo como uma expressão criativa do inconsciente, trazendo também o conceito do arquétipo do inválido que nos fala de aspectos pouco desenvolvidos em cada um de nós, entendendo a invalidez como parte integrante da natureza humana. Abordou também a importância da expressão espontânea compartilhando conosco um pouco da sua experiência com a Dra. Nise da Silveira.

terça-feira, 15 de julho de 2014

EVENTOS, GRUPOS DE ESTUDO E CURSOS PARA O 2o SEMESTRE



AGENDA PARA AGOSTO | SETEMBRO | OUTUBRO

EVENTO

SURREALISMO
Organização e promoção: AARJ - Associação de Arteterapia do Rio de Janeiro
Dia 27 de julho - domingo
Oficinas com Maria Cristina Resende e Bruno Elias
Palestras com Claudia Brasil, Eliana Moraes e Flávia Hargreaves
Local: Casa2. Botafogo. Rio de Janeiro
VAGAS LIMITADAS
INSCRIÇÕES E INFORMAÇÕES VIA E-MAIL : aarjeventos@gmail.com

CURSOS E GRUPO DE ESTUDOS EM ARTETERAPIA

GRUPO DE ESTUDOS: Pratica da Arteterapia
Coordenadora: Eliana Moraes
Segunda - Encontros quinzenais - das 10:30h às 12h
Local: Copacabana – Rio de janeiro
INSCRIÇÕES VIA E-MAIL : elianapsiarte@gmail.com

CURSO: ARTETERAPIA – HISTÓRIA DA ARTE PARA QUÊ?
Curso vivencial de História da Arte e sua aplicabilidade no setting terapêutico.
Com Eliana Moraes e Flávia Hargreaves

MODULO II : ANTIGUIDADE CLÁSSICA E CLASSICISMO
AGOSTO/SETEMBRO
Início: 1 de AGOSTO
Todas as Sextas das 14h às 17h
Carga Horária: 24 horas (8 aulas)

MODULO III : IDADE DA FÉ – MONSTROS, ANJOS E PECADORES
SETEMBRO/OUTUBRO
Início: 11 de SETEMBRO
Todas as Quintas das 9h  às 12h
Carga Horária: 24 horas (8 aulas)

Local: Casa2 – Botafogo – Rio de janeiro
INSCRIÇÕES VIA E-MAIL : elianapsiarte@gmail.com

CURSO: ARTETERAPIA: DADA E SURREALISMO
professora: Flávia Hargreaves
Local: Botafogo
Início:  6 AGOSTO
Todas as Quartas das 10h as 12h
Carga horária: 8 horas (4 aulas)
Local: Casa2 – Botafogo – Rio de janeiro
INSCRIÇÕES VIA E-MAIL : fmhartes@gmail.com

CURSO: CONHECENDO OS MATERIAIS E APRENDENDO A USÁ-LOS
ATELIÊ DE ARTES PARA ESTUDANTES E PROFISSIONAIS DAS ÁREAS DE PSICOLOGIA E ARTETERAPIA.
professora: Flávia Hargreaves
MÓDULO I : Desenho e pintura 
Início: 5 de AGOSTO
Todas as Terças das 18h às 20:30h
Carga horária: 15 horas (6 aulas)
Local: Casa2 – Botafogo – Rio de janeiro
INSCRIÇÕES VIA E-MAIL : fmhartes@gmail.com

ATENDIMENTOS

Atendimento individual em psicoterapia e arteterapia
Eliana Moraes - Psicóloga (CRP 05/36580) e Arteterapeuta (AARJ 579)
Local: Copacabana

Atendimento individual em arteterapia
Flávia Hargreaves - Arteterapeuta (AARJ 402) e Professora de Artes Visuais
Local: Casa 2 - Botafogo

segunda-feira, 7 de julho de 2014

ARTETERAPIA: PRELÚDIO DE VIDA – Um relato

            
         O texto de hoje é um relato escrito por uma paciente de grupo terapêutico em arteterapia para 3ª idade (com sua autorização de publicação). Estas palavras dão sentido ao nosso trabalho e nos motivam a continuar produzindo, teorizando e tentando contribuir para que este saber e técnica se estabeleça e tenha seu lugar.


“O dia 02 de fevereiro registrou na minha vida uma grande perda.
Ali, encerrou-se a página de uma trajetória de emoções, esperanças, alegrias, renúncias, expectativas, encontros e desencontros.
Abalada com a perda e a falta da magia de alguém que amava, procurei a todo custo apoiar-me em Deus. Mas, não era fácil controlar a tristeza. Algumas pessoas do meu pequeno círculo de amizade, diziam-me: ‘dá tempo, tudo vai passar...’ Mas enquanto não passava, a dor maltratava, mais e mais.
Foi então que, na busca constante por algo que me preenchesse o vazio da alma, encontrei a Arteterapia – prelúdio de vida, cujos ensaios semanais de improvisação de pensamento, busquei, através de instrumentos não musicais, tais como lápis de cor, pincéis, telas, colas, cortes e recortes, música, etc... a transformação das ideias e emoções contidas – uma nova forma de viver.
Esta metamorfose, por mais volátil que pareça, contribuiu para renovar o físico, o intelectual, o emocional e o espiritual – efeito positivo dessa catarse natural.
Este processo de transformação não se esgota aqui, ele é contínuo e efetivo, exige de cada um de nós paciência, determinação e humildade para alcançar autoconhecimento.
Foi aqui que encontrei a fórmula para a superação. Foi aqui, que com a força do grupo, descobri o gosto pela pintura, inspiração para as ideias, um tempo para escrever e falar do abstrato. Foi aqui, que conquistei maior conhecimento de mim mesma. Foi aqui, que exercitei a resignação, a paciência, a compreensão, a humildade, a identificação com o simples e o natural, maior convivência com Deus.
É aqui que, em cada encontro, assimilo a explicação para o verdadeiro sentido da vida, mesmo quando o vento sopra contra, e que o sofrimento abre caminho para a evolução espiritual.”

quarta-feira, 25 de junho de 2014

SOBRE O INÍCIO DO PROCESSO ARTETERAPÊUTICO INDIVIDUAL (II)


Por Eliana Moraes


“Qualquer intenção do artista tem que abrir caminho através das malhas de uma rede apertada; Toda obra de arte é o resultado de uma tensão prolongada entre uma série de desejos e uma série de resistências à sua execução.” Arnold Hauser em História Social da Literatura e da Arte

            Dando continuidade às questões pensadas no grupo de estudos “A prática da arteterapia” sobre o início do processo arteterapêutico individual (ver texto anterior), a pergunta é: passada a primeira sessão, em que foi realizada uma técnica de coleta de dados (em geral uma colagem com figuras de revistas) como proceder na segunda, terceira, quarta sessão?
            Primeiramente é necessário ter em mente que apenas um trabalho de coleta de dados, assim como a primeira entrevista na psicoterapia verbal, não é suficiente para que o terapeuta de fato alcance as questões de seu paciente. Outros trabalhos de coleta de dados ainda são muito pertinentes nesta fase inicial. A partir destes trabalhos o terapeuta poderá formular hipóteses que serão confirmadas ou não nos próximos trabalhos realizados pelo paciente. As questões terapêuticas se presentificarão para o arteterapeuta a partir de uma “colcha de retalhos”: retalhos oferecidos pela fala e imagens produzidas pelo paciente que o terapeuta costurará e usará como base para sua atuação.
            A técnica da arteterapia é específica por trabalhar com a imagem, ou seja, a “expressão não verbal”, uma forma de comunicação muito legítima, em que aspectos inconscientes são acessados e materializados, muitas vezes burlando a racionalização e a resistência do paciente. Devido a isto, não é raro de acontecer que no(s) primeiro(s) trabalhos de coleta de dados, o paciente produza uma imagem que conte para o terapeuta boa parte do caminho a ser percorrido ou conteúdos muito profundos, mas que ele esteja completamente  inconsciente disto. O arteterapeuta deve estar atento a este fenômeno aguçando sua escuta e seu olhar para o paciente.
Penso que devemos reconhecer a responsabilidade e a ética que especificamente a técnica da arteterapia nos impõe neste momento. É o paciente  quem irá dizer aonde está seu foco, escolher onde quer (pode) se aprofundar, aonde quer (pode) mergulhar a cada momento, a cada etapa deste caminho. Ao terapeuta cabe buscar sempre estar consciente de si, de suas ansiedades em sua atuação como profissional, lembrando que o foco orientador não deve estar em si mas em seu paciente. Uma boa estratégia é o arteterapeuta elaborar possíveis propostas ou técnicas que sejam pertinentes ao que o paciente trouxe, e mantê-las como “cartas na manga” que serão acionadas uma a uma a partir do que o próprio paciente apresentar como gancho.
Esta é uma jornada que pertence a cada sujeito, e cada um tem o seu tempo próprio. O terapeuta deve acompanhar este ritmo respeitando os limites e as resistências naturais de seu paciente. Lembro de um fragmento do final do texto “Repetir, Recordar e Elaborar” de Freud que citei no texto “A resistência na arteterapia” neste blog. Nele Freud relata sobre médicos principiantes na psicanálise que vinham pedir conselhos à ele sobre como lidar com a resistência do paciente. Em suas palavras:
“O médico nada mais tem a fazer senão esperar e deixar as coisas seguirem seu curso, que não pode ser evitado nem continuamente apressado.”

“Esta elaboração das resistências pode, na prática, revelar-se uma tarefa árdua para o sujeito em análise e uma prova de paciência para o analista. Todavia, trata-se do trabalho que efetua as maiores mudanças no paciente..."